Capítulo 3
Conhecia bem corcundas, já tinha dividido uma casa com um por uma estação, em 1979. No inverno.
Minha vivência com corcundas me levava a criar teorias sobre eles.
A deformidade nas costas, era reflexo somatizado da deformidade moral.
Todo corcunda, é antes um corcunda moral.
Quando morei com Helael, o corcunda, no inverno de 79. Não tinha outra opção.Ou dividia com ele os 2 cômodos, ou morria de frio debaixo de uma marquise qualquer do centro.
A época, eu ainda era formoso, e meu rosto não era sulcado e não carregava as marcas nem as cicatrizes.
Logo na 1ª noite que dormi naquela pocilga, Helael, o corcunda, me atacou. O filho da puta tentou me comer.
Eu estava quase dormindo. Acordei com um peso nas costas, em cima de mim. Um hálito quente no meu pescoço, com palavras e gemidos que eu não decifrava.
Não entendia o que estava acontecendo, tudo muito rápido, o desgraçado fazia um movimento de sarilho em cima de mim. Dei-lhe um safanão com meu cotovelo, e pulei da cama. Ainda sem entender direito.Meio sonado.
De pé defronte minha cama, depois do susto que tomei é que entendi.
Um ódio mortal tomou conta de mim.O corcunda que estava sentado meio torto na minha cama, com o braço na boca por conta da cotovelada que levara, resmungando alguma coisa, e com olhar de raiva por não ter conseguido a curra que desejava.
Peguei-o com as duas mãos pelos cabelos e o arremessei para fora da cama, ele foi parar no outro cômodo. Alguns tufos de cabelo ficaram entre meus dedos. Na época além de formoso eu era fortão.Olhei para o corcunda no chão, ele estava com o braço sobre o rosto, e aquele semblante de raiva impafiosa tinha dado lugar a um semblante de medo e submissão. Meu sangue ainda fervendo, me levou a chutar o corcunda filha da puta para fora da casa.
Ele chorava e gemia.
Minha raiva aumentava.
Quebrei uma cadeira na infame corcova dele. Uma das pernas da cadeira se soltou. Usei-a como um cassetete.
Coloquei o corcunda de novo para dentro debaixo de vara.
Minha raiva tinha se esvaído, e eu sentia frio.
Fomos deitar.
Peguei minha faca, até hoje carrego sempre uma comigo, arrumei a minha cama, e a coloquei do lado do travesseiro.
Falei pro corcunda:
- Corcunda filho da puta, se se aproximar de novo, eu arranco o seu nariz a faca!
Não conseguia dormir, pensava: e se este anormal quiser me sodomizar enquanto durmo?
Me levantei, enchi uma caneca de água, e joguei na cara do maldito.
- Se levanta dai - gritei. O corcunda marrento reclamou do frio e não quis se levantar. Peguei a perna da cadeira e a minha faca, uma em cada mão.
- Levanta - bati com força no joelho do amaldiçoado.
Helael levantou-se, contrariado com mão no joelho atingido, grunhindo alguma coisa, e gemendo pela dor.
- Por que me bateu desta vez? - perguntou o corcunda. Não respondi. Fiquei lá pensando no que fazer.
- Você não vai dormir aqui esta noite, pode ir prá rua. Com você aqui não fico tranquilo, e hoje foi um dia daqueles e amanhã não será diferente, preciso dormir. Se manda.
- Mas tá muito frio lá fora, vou morrer congelado.
Peguei umas cobertas, e uma caixa de fósforos, joguei prá ele.
- Foda-se se vai morrer de frio, não ligo, pega as cobertas e o fósforo, faz uma fogueirinha, e só aparece por aqui depois das onze da manhã. Vou pensar no que faço com você.
Empurrei o corcunda prá fora, revistei os bolsos prá ver se não tinha as chaves da "casa". Não tinha, só uma revistinha "Anal Sex". Filho da puta.
Dei-lhe um chute na bunda, e bati a porta, tranquei e coloquei a cama dele encostada, se ele tentasse forçar, o rangido da cama me acordaria.
Embora soubesse da força descomunal do corcunda, sabia que ele não tentaria nada, ele já estava satisfeito, gostava mesmo era de ser humilhado, sentia prazer nisto, era um corcunda físico e moral.
Dormi como um anjo. Noutro dia arrumei uma algema, e daquela noite em diante Helael só dormia algemado na cabeceira da cama.
A convivência com Helael me permitiu fazer um perfil dos corcundas.
A corcova é formada por excesso de hormônio.
São sexualmente insaciáveis.
A corcova lhes retesa os músculos, junto com excesso de testosterona os deixa muito fortes.
Os olhares curiosos das pessoas pela corcunda lhes cria uma defesa psicológica que os torna amorais e obcecados pelas manias.
São na maioria das vezes inteligentes, não usam a inteligência para nada de útil, ou agradável.
São antipáticos e não fazem questão de disfarçar ou amenizar o defeito.
Pude comprovar durante minha vida que todos os corcundas são mais ou menos assim. Mudam pouco de um para outro....
LAMPIÃO
Comentários
bicho esta estórinha é um capítulo apenas de um projeto maior abandonado por mim.
É uma estórinha de detetive, a única até agora que não é autobiografica.
Não sei se rola em blogs este tipo de coisa.
Quanto ao políticamente correto, espera só até aparecer a lésbica trotskista, e mais a frente o padre fresco.
Hehe.
o que não é politicamente correto?
Bater em corcunda ou não dar pra ele?
Ô menino, você não viu que o conto é de ficção, não?
O corcunda daqui não tem nada a ver com os corcundas que no fim do século XIX a imprensa liberal queria dar um pau, nem com os corcundas que andam por aí mostrando o bumbum pra gente ou tem?
Tem Mathias?
Arre, que agora tô nas dúvida!
Bjs monstruosos pra vcs.
CRICA
Para saber mais sobre os monstros na imprensa brasileira nos fins do sec. XIX, sugiro o site
http://historia.seed.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=36 –
O Helael é sim algo surgido no inicio séc XIX, que fica no inconsciente das pessoas. Algo como o Sebastianismo.Este bem mais antigo.
Helael tem traços de um rapaz bem deformado do Paraventi, chamado Elói, daí o nome Helael, que remete também a "hell"do inglês.
Mas o meu corcunda por enquanto tem apenas um papel ilustrativo na estórinha, mas talvez volte a pedido do meu filho que gostou dele.
Cacete pq estou escrevendo tudo isto???????
Lampião